a garota que me amou
A reconheci pelos
longos cabelos pretos e lisos e também pelo som da risada.
Estava tomando café no Starbucks
depois de um longo dia de trabalho e ao olhar para o balcão vi uma garota
baixinha e logo reconheci os cabelos negros e a voz dela ao rir com alguém no
celular.
Incrível, mas depois de
cinco anos, ela continuava com aquele rosto de menina travessa, com bochechas
rosadas e a pele clara. Não usava mais aparelho, agora sorria e tudo o que se
via era dentes retos e brancos e aquele mesmo batom vermelho que me deixava
embasbacado.
Voltei no tempo e me vi
ao lado dela, observando aquele jeito atípico com o mistério que me fez perder
o sono.
A garota estava sempre
com um livro na mão, com o rosto escondido pelos cabelos enquanto lia. Sorria para
a página, fazendo eu querer espiar por cima de seu ombro e ver o que a fazia
sorrir, aquele sorriso contido de quem não quer ser notada, mas eu me
contentava em respirar o cheiro de flor do perfume dela e me sentar no banco de
trás. Parecia um jogo.
Cada vez que ela
entrava no ônibus, eu sabia que sentaria no banco em frente ao meu e quando eu
chegava depois, sentava no banco de trás, vendo ela ler pelo reflexo da janela,
querendo afastar seus cabelos do rosto e descobrir se o que lia lhe fazia
sorrir.
Foram meses desta
forma. Ela compenetrada lendo e eu compenetrado nela, mas um dia algo mudou. Ela
me notou. Aquele olhar rápido que fazia seu rosto ficar corado, sendo que meu
estado também não era dos melhores. Não sabia o que fazer e acho que ela também
não.
Em alguns dias, a
garota não conseguia se concentrar no livro, mas eu continuava concentrado
nela, sendo desastrado a ponto de derrubar o que estava em minha mão, ou bater
no banco dela, acho que, no fundo, querendo chamar sua atenção.
Nos dias em que ela não
lia, ficava tamborilando os dedos em cima da capa do livro. Ela tinha mãos
pequenas e com esmalte preto, descascado no dedo indicador, além de manchas de
caneta na pele, alguns lembretes escritos nas costas da mão, algo parecido com
latim.
Em uma quarta-feira,
ela sentou no banco oposto ao meu, do outro lado do corredor. Desta vez o livro
ainda estava no pacote. Ela se atrapalhou para tirar a embalagem e eu me vi
ansioso por ser útil, mas antes que eu fizesse algo, ela desembrulhou o livro e
começou a ler, com a cabeça baixa e com os cabelos cobrindo o rosto.
Aquele mistério todo me
deixava intrigado. Qual seria seu nome? O que fazia e por que gostava tanto de
ler?
Mas, por mais que eu
quisesse, as coisas continuavam iguais. Ocasionalmente ela me olhava, mas não
por tempo o suficiente para que eu conseguisse ver algo em seus olhos, somente o
batom vermelho.
O ano terminou e por um
acaso do destino, descobri que ela tinha nome de flor e que os riscos em sua
mão era em decorrência de ser escritora. Escrevia bem e eu me encontrei nas
linhas dela. Reconheci o lado inverso da minha situação. Ela gostava de mim,
enquanto eu achava que ela era o mistério que deixava minhas idas para a
faculdade interessante.
Não soube o que fazer
com a informação que tinha, mas nesse meio tempo conheci outra garota, que
parecia a certa e comum.
Percebi a tristeza nos
olhos da garota com nome de flor quando me viu com a nova garota, mas não fiz
nada. Então ela deixou de pegar ônibus e o mistério perdeu a graça.
Conheci outra garota,
que também achei que era certa, e ela me viu com essa garota. Dessa vez vi
lágrimas nos olhos dela, mas ela não percebeu que eu vi.
Continuava lendo o que
a menina com nome de flor escrevia e os textos pareciam cada vez mais tristes,
mas eu não gostava dela desse jeito, ou melhor, não conseguia admitir que
gostava de alguém com que nunca havia trocado uma palavra e que estudava na
mesma faculdade que eu.
E mais um ano se
passou. Eu não a vi mais. Ela deixou de escrever sobre o garoto que partiu seu
coração, mas algo dela ficou em mim.
Agora ela está ali,
parou de falar no celular e tirou um livro da mochila vermelha.
Pego meu café e vou em
direção a ela. Sento na banqueta ao seu lado e esbarro em seu braço
propositalmente.
Ela me olha e arregala
os olhos. Me reconhece. O rubor cobri suas bochechas e eu resolvo ter a atitude
que deveria ter tido há seis anos:
- Oi, esse livro que
está lendo é bom? – Indago, apontando para o livro de capa rosa que está em sua
mão, as unhas agora pintadas de azuis e a pele clara ainda manchada de riscos
de caneta.
A garota com nome de
flor coloca o livro em cima do balcão e olha para meu rosto, o que faz com que
fique mais corada ainda.
E então, depois de um
minuto que mais pareceu uma hora, ela faz o inesperado: primeiro sorri e depois
ouço o som melodioso de sua risada.
- Jariane
Ribeiro
Adorei o texto! Está mesmo lindo!
ResponderExcluirHá giveaway a decorrer no blog! Participa!
Beijinhos
http://that-g-i-r-l.blogspot.pt/
Obrigada!
ExcluirPode deixar que eu vou olhar sim ♥
Que texto lindo! Amei!
ResponderExcluirEleutheromania
Muito obrigada!
ExcluirFico feliz que tenha gostado ♥♥